quinta-feira, 25 de junho de 2009

pai e filho

Que falta você faz, pai. Daria tudo para ouvir uma única palavra sua; para ouvir sua voz me dizer apenas:
- Filho
Você continua anos e anos a fio nesse silêncio, enquanto o sinto cada vez mais forte ao meu lado. Será que está chegando o tempo de te rever ou será, ainda, que haverá um rever? Queria tanto poder afirmar isso com a convicção dos que dizem:
- Eu sei porque foi MEU PAI quem falou!
O inverno e o frio do seu silêncio aumentam ainda mais essa saudade e, quando penso, imagino que em suas terras só existem primaveras. Não consigo mais lembrar de cenas completas e só retalhos de momentos junto de ti, feito uma fotografia que o tempo foi se encarregando de pouco a pouco ir apagando, é o que possuo. No entanto, sua essência invade mais e mais o meu ser e esse saber do para sempre me fere demais.
Sabe, pai, morrer num dia de Natal não é o melhor presente que se dê a um filho. Isso não se faz e você não tinha esse direito. Não tinha o direito de me entregar os natais da eternidade para me castigar para sempre. Temo passá-los todos sem entender. Mas existem tempos em que todos os dias parecem natais e você insiste em me olhar feio por eu sentir assim. Sentir falta não é malcriação, você sabia? Acho que sabe, sim.
Sua presença me espiona em meus quartos, porém é como uma música sem letra e quando te sinto ao meu lado, vem essa canção triste que não me abandona.
Sinto, vivo, me desespero e você não diz uma só palavra.
Ilumina-me incansável, mas não consigo expressar a ninguém aquilo que me irradia. Desconheço seu jeito de se fazer entender e nem me dou conta que estamos em mundos diferentes. Só sei traduzir para mim mesmo essas loucuras que você vive falando sobre ter fé e paciência, embora não me convença.
Então o meu ser chora por inteiro. Por mim, pelo meu egoísmo, pela tua falta. Por saber essa dor que não cede. Ainda assim, peço para ficar sempre junto de mim e que não se atreva nunca mais a me deixar sozinho nesse parquinho de brinquedos velhos. Por favor, dê-me sua mão e não vou mais ligar por me ver como um menino. Quanto mais o tempo passa, mais percebo que você tem sempre razão.
Perdoe-me por estar assim, pai. Não é manha - é o medo da tristeza dessa tua ausência absurda. É a emoção que vem quando estou na tua presença - tão inimaginável quanto concreta.

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crédito de imagem: filipe silva - olhares.com - portugal

domingo, 21 de junho de 2009

on line & off line

O amor traz em si algumas coisas que levam a outros patamares da existência. Confunde, modifica, encaixa, ajusta, gera,embeleza.
Como se fosse um software que liga o espiritual e o físico,é uma das manifestações da grandeza de um Criador, cujo compreender nos foge ao domínio. Pode não ser entendido na sua plenitude ou nas suas regras malucas, mas é a configuração da perfeição.
É um hacker que invade sorrateiro as nossas vidas. Modifica nossos sistemas; muda nossos programas e redireciona a seu bel-prazer os nossos rumos. Zomba da lógica, ignora o tempo e manipula o impossível. Foge de nós e se mostra travesso. Rebelde aos nossos comandos – brinca feliz – mostrando janelas jamais imaginadas; exibindo pop-ups indecentes. Instala-se sem volta e sem opções. Tira-nos a configuração, o verme! (ou vírus?) Depois de rastrear, fisga dois corações desprotegidos e expostos. E coloca-os on-line, insensível a qualquer resistência ou apelo. A cada instante, uma química se faz e refaz. Corpos sedentos de amor e de junção, num download sem fim.
Uma busca insana; eterna sede. Insaciável sede que toma conta. Idéias que urgem ser trocadas, palavras e palavras se multiplicando como células. Milhares delas, misturadas sem parâmetro. Cabeças confusas, descontrole de tudo. Sensações nunca experimentadas. E ficamos perplexos, tentando explicar tudo; buscando na sensatez uma cura que não vem. Nem virá.
Criando pretextos e nos mostrando ingenuamente protegidos, pensamos em nos livrar, como quem procura a cura para a felicidade. Procuramos uma vida por ela e quando localizamos seus arquivos, temos medo de abrí-los.
– Irônico, não?
Só que na vida, não tem como se mostrar off-line. A mente não tem esse menu. É um adware sem volta no coração. Por mais que as bocas venham a negar, por mais que dissimulem, ficarão contaminados para sempre. Os dois, por mais que se enganem e busquem outros amores terão em si, uma insistente mensagem:
– Impossível excluir o arquivo “euevc.exe”.
Arquivos com esta extensão não podem ser removidos! Estão protegidos!
E se um dia o destino resolver colocar-nos off-line para sempre ou que os caminhos da vida nos separem, vamos saber que esses arquivos estão compartilhados; ainda que ocultos. Intactos. Incorrompíveis.
Então vamos entender que:
– Se o tempo é o senhor da razão, o amor desconhece o tempo...
imagem: internet