domingo, 13 de novembro de 2011

pavores e certezas

Quando amanhece vem o medo de que os olhos, de desejaram-se tanto, ceguem ao perceber o dia. E não consigam mais ver a cidade de sonhos que foi criada na imaginação de dois habitantes, cheia de praças de crianças sorridentes; de igrejas que tocam sinos suaves todas as noites, das ruas tortuosas de nossos corpos, nossas pontes.
Receio de não mais voar entre as velhas árvores que plantamos num piscar de olhos, de nossos labirintos e vielas cheios de bares com música suave. Não mais ver nossas sombras coloridas, só possíveis para os de pura paixão.
Arrepios assustados por não ver lençóis e travesseiros desarrumados – que parecem a pintura do paraíso – monumentos de querer bem. Pavor de arrumá-los, pois se o fizermos, arrasaremos nossos quarteirões construídos com a delicadeza dos cúmplices. Temer que ao raiar do dia, nossas nascentes sequem e nenhum líquido nunca mais brote de nossas fontes de prazer, cheias de luzes coloridas.
Lamentar o som do chuveiro de quem se prepara para sair, como se os sons dos gemidos e sussurros da madrugada não lhe bastassem. Preferir a cegueira ao ver a porta se abrir e outro se esvair de nós, feito gás que se desprende de uma bebida; deixando-nos feito restinho de refrigerante abandonado.
Ciúme por ter que emprestar nosso alguém à cidade, agora de verdade. Visualizar pernas, braços, sorrisos e vestidos que vão movimentar-se, como criança - ingênua e linda - entre calçadas, avenidas ou o escritório. Jurar que nossos carinhos são lugares mais seguros.
Sair também para o dia sem graça que se arrasta e com a certeza de ter lido em algum lugar que o mundo terminaria hoje. Medo e angústia do nunca mais.
Retornar à noite e sentado no sofá, na solidão da sala, meio a tantas lembranças - vê-la entrar com um sorriso e uma sacola enormes; olhos brilhantes de diamantes e abrindo braços como quem pede para brincar de desarrumar lençóis e morrer de amor. Nos corações, toda a certeza do mundo.
Na sacola - uma Coca-Cola. Bem gelada.

texto: paulo moreira
imagem: google/coca-cola
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sábado, 5 de novembro de 2011

novas lágrimas


Não quero mais os quadros do passado brincando com os sentimentos. A história eu já sei de cor. E, exatamente por isso, sei que é preciso tirar as velhas roupas e viver com o que há de vir. Só o passado traz medos e me faz morto.
Necessito da mágoa nunca antes sentida; da saudade do que ainda não passei. Serão bem vindas as tristezas inéditas. Hei de me contorcer em dores agudas - com gemidos e olhos de dó de mim - pelo simples prazer de conhecer novas feridas.
Preciso dos desenganos, dos desatinos e de novas decepções. Almejo, com toda a força da minha alma e mais do que nunca, o novo - o não vivido.
Quero um amor com todas as infelicidades que ele possa me dar.
E poder, com plenitude e intensidade, chorar minhas novas lágrimas.

texto: paulo moreira
imagem: arquivo pessoal
música: dashboard confessional - swiss army romance - powered by:
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