Na mesma semana em que a conheci, ganhei alguns tomates. Uma versão pequenina dos comuns. Lindos tomatinhos.
Encantado com sua beleza – a mulher – num instante plantei-a em mim. Precisava tê-los sempre comigo - ambos. Ah! Aquela nova cor de vida, a pele, a delicadeza, aquele novo gosto adocicado.
E espalhei suas sementes em meus territórios. As de tomates, no jardim em frente ao quarto; as dela, num jardim sem cuidados dentro em mim. Terras difíceis, jardins de sonho sem adubo.
Tomates-cereja e amor são plantas resistentes - que insistem em brotar sempre. Num dia de primavera olhei da janela e descobri algumas pequenas folhinhas explodindo da terra. Lembrei-me dela – estávamos sempre unidos - e vi que também soltava folhinhas tenras, nas minhas terras quase áridas. Como é lindo poder desfrutar do milagre das sementes. É possuir quase toda a beleza do mundo.
Começavam dois ciclos de semeaduras que nunca imaginei serem tão parecidos. Sorri para a vida. Meus jardins prometiam fartura. No final da primavera, abandonei meus pés de tomate-cereja, o quarto, o jardim, tudo. E fui ao encontro da planta que mais cresceu: o amor daquela mulher que possuía a magia das sementes.
Não sabíamos quem era quem; quem plantava ou cuidava. Éramos sementes e semeadores simultaneamente. Se, por um lado, o agricultor é responsável pela planta, por outro, a planta passa a ser a luz dos seus atos. Se o primeiro rega folhas e raízes ou deixa que as chuvas dêem provimento, a outra lhe lapida a essência e traz o evoluir dos ramos de sua humanidade. A natureza faz, com humildade e perfeição, o que alguns de nós não conseguimos, às vezes, por imposição do egoísmo.
E dessa mulher conheci o néctar, me encontrei em seu corpo, desfrutei seu sabor. O mesmo ela o fez comigo. Retirou minha pele grossa para apaziguar meu sumo. Plantou-me dentro de si e nos fizemos uma só árvore.
Árvores, quando tiradas de sua cova de origem, reagem ao novo lugar. Assim, momentaneamente, voltei para meu antigo solo seguro e encontrei meus pequenos pés de tomate-cereja em flor. Retirei os matos em volta, os empecilhos e lhes dei arrimo. Vieram os frutos. E da minha plantinha provei o néctar, desfrutei sua polpa e saboreei seu suco. Meus pequenos frutos tiraram-me a acidez da alma na sua lição dos ciclos. Cultivaram em mim, tanto quanto ela, o amor. Juntos, os três, apesar da distância. A grande árvore e a pequena planta totalmente diferentes em sua aparência, mostravam-se iguais em suas estações não compromissadas, entre si, com o tempo.
Ambos seguiam ensinando-me caminhos. Havia me descoberto como uma planta buscando o sol. No final do outono seguinte, o tomateiro secou. Em certo tempo, ela também desaparecera. Depois, resssurgíamos fortes e renovados, como sempre, para novas estações de novas experiências e novos frutos. E assim foi continuadamente.
Voltado para meus problemas e indiferente ao que me cercava, deixei que os matos crescessem e, por falta de meus cuidados, os tomateiros que tanto quis estavam pelo chão sem sustentação e quase sem vida. Condenados por mim. Um senhor que cuida de jardins, apiedou-se das plantinhas que teimavam, ainda assim, em florir e deu-lhes estacas para apoio, arrancando as ervas daninhas em volta. Veio a chuva e os tomates-cereja voltaram a brotar ainda mais lindos.
Mas eu sabia que era diferente. Seus frutos não mais me pertenciam, a não ser por circunstância. Nunca estiveram tão lindos ou responderam tão bem ao cuidado recebido. Em nenhum momento haviam deixado de ser meus pés de tomates-cereja. Durante o tempo todo, eu é que deixei de ser seu cultivador.
No entanto, suas fortaleza e determinação não se deixaram abater pela minha ausência de atitude. Alguns podem estar marcados, mas estão vivos e confiantes em sua missão de tomates e apenas por generosidade para comigo permanecem num território sob meu domínio. Talvez, um gesto de gratidão pelas sementes na terra colocadas um dia, embora abandonadas ao sabor das intempéries.
Quanto aos frutos, não quero e não posso mais provar-lhes e assim será. Não lhes fiz juz.
Quanto a mim, não sei nem plantar, nem amar.
Os pássaros espalharam suas sementes que agora brotam em novos pontos. Tentarei ajudá-los a obter seu alimento, cuidando com um pouco mais de amor e zelo - das minhas plantinhas. Isso os fará mais felizes: os tomatinhos e os pássaros. A mim também.
É possível reparar o sofrimento causado aos tomates-cereja.
texto - paulo moreira
Encantado com sua beleza – a mulher – num instante plantei-a em mim. Precisava tê-los sempre comigo - ambos. Ah! Aquela nova cor de vida, a pele, a delicadeza, aquele novo gosto adocicado.
E espalhei suas sementes em meus territórios. As de tomates, no jardim em frente ao quarto; as dela, num jardim sem cuidados dentro em mim. Terras difíceis, jardins de sonho sem adubo.
Tomates-cereja e amor são plantas resistentes - que insistem em brotar sempre. Num dia de primavera olhei da janela e descobri algumas pequenas folhinhas explodindo da terra. Lembrei-me dela – estávamos sempre unidos - e vi que também soltava folhinhas tenras, nas minhas terras quase áridas. Como é lindo poder desfrutar do milagre das sementes. É possuir quase toda a beleza do mundo.
Começavam dois ciclos de semeaduras que nunca imaginei serem tão parecidos. Sorri para a vida. Meus jardins prometiam fartura. No final da primavera, abandonei meus pés de tomate-cereja, o quarto, o jardim, tudo. E fui ao encontro da planta que mais cresceu: o amor daquela mulher que possuía a magia das sementes.
Não sabíamos quem era quem; quem plantava ou cuidava. Éramos sementes e semeadores simultaneamente. Se, por um lado, o agricultor é responsável pela planta, por outro, a planta passa a ser a luz dos seus atos. Se o primeiro rega folhas e raízes ou deixa que as chuvas dêem provimento, a outra lhe lapida a essência e traz o evoluir dos ramos de sua humanidade. A natureza faz, com humildade e perfeição, o que alguns de nós não conseguimos, às vezes, por imposição do egoísmo.
E dessa mulher conheci o néctar, me encontrei em seu corpo, desfrutei seu sabor. O mesmo ela o fez comigo. Retirou minha pele grossa para apaziguar meu sumo. Plantou-me dentro de si e nos fizemos uma só árvore.
Árvores, quando tiradas de sua cova de origem, reagem ao novo lugar. Assim, momentaneamente, voltei para meu antigo solo seguro e encontrei meus pequenos pés de tomate-cereja em flor. Retirei os matos em volta, os empecilhos e lhes dei arrimo. Vieram os frutos. E da minha plantinha provei o néctar, desfrutei sua polpa e saboreei seu suco. Meus pequenos frutos tiraram-me a acidez da alma na sua lição dos ciclos. Cultivaram em mim, tanto quanto ela, o amor. Juntos, os três, apesar da distância. A grande árvore e a pequena planta totalmente diferentes em sua aparência, mostravam-se iguais em suas estações não compromissadas, entre si, com o tempo.
Ambos seguiam ensinando-me caminhos. Havia me descoberto como uma planta buscando o sol. No final do outono seguinte, o tomateiro secou. Em certo tempo, ela também desaparecera. Depois, resssurgíamos fortes e renovados, como sempre, para novas estações de novas experiências e novos frutos. E assim foi continuadamente.
Voltado para meus problemas e indiferente ao que me cercava, deixei que os matos crescessem e, por falta de meus cuidados, os tomateiros que tanto quis estavam pelo chão sem sustentação e quase sem vida. Condenados por mim. Um senhor que cuida de jardins, apiedou-se das plantinhas que teimavam, ainda assim, em florir e deu-lhes estacas para apoio, arrancando as ervas daninhas em volta. Veio a chuva e os tomates-cereja voltaram a brotar ainda mais lindos.
Mas eu sabia que era diferente. Seus frutos não mais me pertenciam, a não ser por circunstância. Nunca estiveram tão lindos ou responderam tão bem ao cuidado recebido. Em nenhum momento haviam deixado de ser meus pés de tomates-cereja. Durante o tempo todo, eu é que deixei de ser seu cultivador.
No entanto, suas fortaleza e determinação não se deixaram abater pela minha ausência de atitude. Alguns podem estar marcados, mas estão vivos e confiantes em sua missão de tomates e apenas por generosidade para comigo permanecem num território sob meu domínio. Talvez, um gesto de gratidão pelas sementes na terra colocadas um dia, embora abandonadas ao sabor das intempéries.
Quanto aos frutos, não quero e não posso mais provar-lhes e assim será. Não lhes fiz juz.
Quanto a mim, não sei nem plantar, nem amar.
Os pássaros espalharam suas sementes que agora brotam em novos pontos. Tentarei ajudá-los a obter seu alimento, cuidando com um pouco mais de amor e zelo - das minhas plantinhas. Isso os fará mais felizes: os tomatinhos e os pássaros. A mim também.
É possível reparar o sofrimento causado aos tomates-cereja.
texto - paulo moreira
2 comentários:
Parabéns pelo seu texto, a amiga Rosani que me indicou seu blog, e gostei muito. Leva à cada um buscar seu próprio entendimento num só rumo .Devo dizer, que cada um de nós sabe de sua própria agricultura.
Obrigado
É....
As vezes você não soube como cuidar de suas plantinhas e elas murcharam...
Novas sementes virão, saiba cutivá-las!
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