quinta-feira, 28 de agosto de 2008

convite


...são apenas palavras,
e palavras são apenas o que tenho
para levar seu coração embora...
Bee Gees

Perfume de Coração é um livro que conta histórias de vida, através de crônicas, contos e poesias.
É a expressão de um homem que prefere ter um coração-menino ao olhar o mundo.
Uma tentativa de compartilhar - através de palavras - os sentimentos e as emoções.
Ver e enxergar as pessoas com olhos de beleza.
Poder sentir essa maravilhosa fragrância que exala, sutil, das pessoas que me cercam. Cada qual, com sua essência única e generosa.
Gostaria, portanto, de ter você ao meu lado num momento tão bom.
E sentir num abraço, esse doce aroma que é o Perfume de SEU Coração.


Não é necessário apresentação do convite. Basta você apresentar sua senha:
- Seu melhor sorriso

Coquetel de Lançamento do Livro
Dia 30/08/2008 (sábado)
Das 16 às 19 horas
Editora All Print
Espaço Cultural Antonio Adolpho
Rua Ibituruna, 550 - Saúde
Saõ Paulo - SP

texto: paulo moreira

sábado, 16 de agosto de 2008

estranho ofício

Estranho ofício esse. Às vezes, acordando em sobressalto no meio da noite, para atender a urgência de uma idéia, feito um policial percorrendo as ruas do labirinto de nós mesmos. Personagens que surgem e dos quais temos a obrigação de lhes contar as dores, os sofrimentos, o amar, o tudo sentir. Escrivão do tribunal da própria consciência, relatando acontecimentos que marcam o espírito. É assim.
Como uma criança que vive seus sonhos, sou pintor. E meus pincéis são palavras, capazes de colorir sonhos, de produzir telas de natureza viva ou morta. Pintor de casas de toda cor, inclusive das que já a perderam. De árvores secas ou floridas, depende. Um pedreiro que assenta as palavras dos muros de arrimo da esperança. Açougueiro que apunhala o coração sem piedade. Soldado sem quartel.
É esse o ofício. E mais.
Médico amigo que socorre corações e lhes cura as feridas. Cirurgião plástico que modela a amada à feição de fada ou, talvez, um psicólogo navegador que - paciente - ouve, propõe buscas, orienta rumos e viaja Brasis e outros mundos. É o curador ou charlatão de almas tantas, mesmo a sua. Um professor que presume tudo poder ensinar.
Escrever é assim.
Sou engenheiro de palavras, viabilizando o impossível num tear de tramas do fundo de alguém. O iluminador de caminhos, talvez. O palhaço arrancando sorrisos e ternura de uma criança de qualquer idade. Anjo veterinário dos animaizinhos - enxerga cada um como um filho.
Minha profissão são todas e, em cada uma, tento ser o melhor possível. Alimento-me de emoções e as dos outros, pretensiosamente, quero alimentar também.
Sou o músico da poesia ritmada ou sem rima ou rumo. Cineasta e diretor do filme que escolhe o final feliz ou não, conforme meu estado. Filmo cenas de amor, de aventura, dos horrores do mundo. Tudo num papel. Walt Disney de algum desenho animadíssimo. Kubrick de coisas ininteligíveis, mas instigantes.
Emociono-me igualmente com sorrisos ou lamentos. Ambos mexem comigo de uma maneira fortíssima. Despertar a emoção das pessoas é a realização do meu trabalho. A minha maior paga.
Escrevo e faço do meu escrever um testemunho do mundo, de defesa do que me parece justo. Advogado dativo, preposto da natureza, dos amantes, dos sonhos, do Céu e da Terra. Se alguém os agride - enquanto juiz - condeno ao exílio ou à morte perpétua. Passo o concreto e o virtual para um único plano; o dos sentimentos traduzidos em palavras. Arrancar lágrimas, leva-me a um estranho tipo de êxtase.
Ao menos, tento.
Sou nada real. Mas, ainda que absurdo, faço as pessoas pensarem. Um chanceler de todas as profissões e afazeres do mundo. Do amor também.
Na verdade, sou apenas um escritor.

***
texto: paulo moreira

terça-feira, 5 de agosto de 2008

lentes na escuridão

Acordou e não conseguiu tão rápido cair em si. O sonho houvera sido muito marcante e ainda levava consigo as sensações dele. Sonho de beijos molhados e rostos desconhecidos; na seqüência, ruas vazias e a névoa de uma noite de abandono.
Apalpou ao lado procurando os óculos, enquanto os pés procuravam os chinelos. Encontrou-os pela automação diária dos hábitos. Levantou-se e tateou até o interruptor. A luz repentina invadiu os olhos que arderam. Resolveu não acender mais nenhuma e ficou arrastando-se pela casa. Com a mente não atinando em nada, tropeçou no tapete. Tropeços são parte da vida.
Na escuridão da sala tentava pensar em algo, mas estranhamente nada surgia para poder pensar. Ainda estava sob a emoção do sonho, do qual só trazia resquícios de sensações procurando a lógica da letargia. Nada. No sofá, apenas vultos dos móveis e um silêncio desafiador. Madrugada.
Sem fome, passou pela cozinha indiferente e andou feito um zumbi pela casa. Foi e voltou várias vezes. A mente ainda vazia. Só restava voltar para o quarto e continuar o sono.
Entrou, apagou a luz e deitou-se na cama. Não havia tirado os óculos e só ao virar-se para o lado sorriu do detalhe bobo. Sentiu-se idiota ao tirá-lo e recolocá-lo umas três vezes para comprovar o óbvio. No escuro total do quarto não fazia a menor diferença tê-lo ou não.
As lentes não eram menos lentes nem seus olhos menos míopes. Assim como o armário, o quadro e a janela eram os mesmos. Pensou na tolice que lhe guiava os sentidos e sentiu-se como um nenê pensando diante do chocalho no berço. Na escuridão total, nada faz diferença.
Passou pela cabeça o nome daquela pessoa e, susto maior, nenhuma imagem surgiu. Imaginava sempre as noites que passaram juntos e das quais trazia as lembranças que, hoje em especial, teimavam em não surgir.
Deu-se conta dos tempos que ali passara e sempre que fechava os olhos vislumbrava as cenas do que fora amor. Noites agitadas em que acordava com o corpo chamando por esse alguém; em que as próprias mãos passeavam pelo corpo inquieto, como fossem capazes de trazer a presença de um dia. Dos beijos dados no próprio braço, tentando reproduzir o calor daquele corpo, ficava a desilusão da ausência.
Tinha amado como ninguém jamais ousara. Houvera abandonado tudo em razão da luz daquele amor. Abandonara, talvez, a própria vida em direção a ela. Dos momentos sentia a falta; desde cada beijo ou carinho trocado, até o fundo da alma cicatrizada pela distância muita e o desprezo mudo.
Até então, bastava fechar os olhos e pensar naquele amor, para que no escuro e na solidão de seu quarto surgissem aquelas paisagens iluminadas de lindas cenas indecentes. Vinham os planos a dois, as conversas trocadas, as esperanças. A vida tornava-se luz.
Mas, naquela noite não era mais assim.
Sabia que, a partir dela tudo estaria ali, a exemplo de seus armários, janelas e objetos. Embora ali estivessem - seus olhos, suas lentes e o resto do quarto não seriam suficientes para resistir à ausência de uma nesga de luz que fosse. Era impossível enxergar alguma coisa.
Lembrou-se de ter dito um dia que a ausência do ser amado fazia sua vida tornar-se noite. Tinha razão.
Só então caiu em si.
Na mesa de cabeceira faltava alguma coisa. Talvez um porta-retratos. Mesmo que apalpasse, acendesse a luz ou colocasse os óculos não o veria mais, mesmo que estivesse em outro lugar da casa.
Seu coração foi retirando pouco a pouco, entre tantos desacertos e desencontros, esse alguém de dentro de si.
Não era necessário mais pensar. Era suficiente saber que, mesmo que poderosas lentes fossem colocadas em seu coração, este não enxergaria mais o amor que havia ficado em algum lugar do caminho, onde as estrelas cintilavam ou onde o sol nascia senhor da Terra. Sem luz alguma.
Virou-se para o lado e dormiu diferente dos dias em que dormia para poder sonhar. Dormiu sem porquê; nem feliz, nem infeliz. Dormiu para permitir que o dia amanhecesse.
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texto: paulo moreira
imagem: pedro moreira