domingo, 15 de agosto de 2010

a força da generosidade

Sempre uma força nos move. Ninguém age, pensa ou cria sozinho. Sempre precisamos de parceiros, seja no que for; seja onde for. Todas as forças, positivas ou negativas nos levam a algum lugar. O amor, o ódio, a revolta, o bem querer, a amizade, a humilhação, o desejo, o orgulho, a timidez, a humildade.
Nem todos sabemos abertamente agradecer (sou um desses), mas em certos momentos precisamos refletir um pouco. Ser grato a Deus, mas não apenas.
Meu ofício é escrever. Só que, muitas vezes, noto que nem sempre o que escrevo veio apenas de mim, mas sim de forças que geraram as idéias. Na psicografia, o médium sabe que a autoria intelectual da obra vem de um espírito – embora não seja meu caso - ou, para quem acredita assim, assim o é. Para os que não acreditam, citaria Pirandello – Assim é, se assim lhe parece.
Meu notar é bem mais que isso. Refere-se a algo que vem de nós mesmos, mas foi gerado por outras pessoas. Se fiz lindos textos de amor é porque vivi grandes momentos de amor. Se escrevi angústias foi porque as sofri. Se lembrei dos amigos é porque os tive e os tenho.
Tudo o que acontece em volta de nós, é fonte criadora. Atitudes, pensamentos, teorias, caráter, sucesso ou insucesso. Tudo depende de como extravasamos o que sentimos. Concluo que criar nada mais é que gestar sentimentos com uma pitadinha de nós mesmos.
Uma dessas forças que obrigam pensar diferente é a gratidão. Para quem escreve, não saber o que acham sobre o que foi escrito é o desespero – é como ter gritado no deserto. É como ter-se tornado a própria solidão.
Leio, ávido, todos os comentários que fazem acerca de meu trabalho e, a melhor conclusão que cheguei é que este trabalho não é totalmente de minha autoria, ou inspiração ou um presunçoso talento. Preciso desse retorno para continuar, para ter inspiração, motivação – fé! É uma energia que leva a criar. Ele resulta das forças que sobre mim agem de forma transformadora e que trazem magia e beleza às minhas mãos – por vezes, sinto assim.
Não posso dizer sobre a qualidade do que faço, mas percebo quando dei o melhor, pois tenho retorno. Nessas horas, brota a gratidão. A tudo que me cerca, às pessoas que de alguma forma se aproximaram de mim ou se manifestaram, seja da forma que for. A todos e, em especial, a quem acompanha meus textos e de alguma maneira se sentem tocados.
Esse texto, eu gostaria de não assiná-lo como autor. Certamente é um texto que pertence àqueles que criaram essa energia.
Maior que meu sentimento de gratidão é a generosidade advinda desses seres de luz – verdadeiros autores de mim.
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Autoria do texto: regina coeli (from minas gerais), luis coelho, rosani nauar, djalma(a paz com perninhas) luciano facu, du facu, florzinha, zaia, sueli,euemmim (Zil), manuel marques, angela, sil, patrícia, maria josé, fátima simãozinho, suavemente helena, mari, manuela freitas, juliana pipa-pião, c@urosa, lúcia, sirlei, jaime, doroni hilgenberg, marlene, solbarreto, rosana, conceição, calcinha de algodão, sonia, minha mãe, uns tantos injustiçados que terão a generosidade de me perdoar... e eu (paulo moreira)

imagem: photoforum.ru - rússia

segunda-feira, 12 de julho de 2010

aqui, ali e em todos os lugares

Haverá um alguém que sempre nos acompanhará. Em cada brisa que soprar, no canto de um pássaro, nas noites de solidão, em cada horizonte. E haverá que estar em nós, em tudo que pudermos ver ou perceber. Estará em todos os lugares por onde passarmos. Em toda vida e por todos os caminhos.
E há que voar nossos sonhos e povoar nosso melhor sentir. Vai nos ocupar feito inexplicável luz. A cada passo, cada ação e cada pensamento.
Será música, esperança e alento. Será paz e silêncio. Terá sido o inesquecível e o maravilhosamente absurdo. O impensável.
Será nosso amor que chegou desde não sabemos quando. E caminhará conosco, sorrindo. Até sempre!

imagem: grENDel - olhares.com - portugal
texto: paulo moreira

quinta-feira, 4 de março de 2010

beleza

O mundo terá a cor dos seus olhos.

imagem: internet (rosani nauar)

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

daluca

Daluca tinha duas paixões nesse mundo: O marido Neca e a gata Dargisa. Passava os dias a arrumar a casinha para a chegada do Neca, que vinha no final do dia lá da roça. Depois de arrumar a casa e fazer a comida, ficava fazendo um tricot ou um crochet, remendando as roupas de casa ou bordando umas toalhinhas. Sempre com a Dargisa do lado.
A gata era a amiga fiel de todos os dias, que deitava-sejunto dela no alpendre e lhe ouvia as confidências de todo tipo. Não havia um só sentimento de Daluca que não conhecesse. Até os momentos mais íntimos e fogosos com o marido, a gatinha sabia. Tintim por tintim.
O marido era um homem da roça. Semeava arroz, feijão,milho, café e plantava a horta para a mulher cuidar e policiar contraas galinhas. Tirava leite das vacas, tratava dos porcos e capinava
suas plantações. Adorava ficar na beira do córrego pescando; ou melhor, sendo feito de bobo pelos lambaris “veiacos e ladrões de minhoca”. Segundo namoro que teve na vida, viu nos olhos e na beleza de Daluca – as estrelas – e resolveu cultivar, também, o céu. Na simplicidade dos dois, fez-se o amor maior do mundo.
Diz a Daluca, certa vez, para uma comadre:
– E num é que o desgraçado do Neca me aparece morto em casa, sem nem avisar?
Atingido por um raio, lá no meio da plantação, ele se fora.
Comoção, gritaria, inconformismo, o fim do mundo. E lá no meio da sala, o caixão com o que sobrou do Neca, para a visitação dos poucos amigos.
Daluca chorando como nunca, desesperada, se deixa ruir no sofá velho e, com a bunda, mata dois gatinhos – da cria de cinco – da Dargisa. Inconformada, pega a gata nas mãos esticadas e desabafa:
– Desculpa, filha. Tô viúva do Neca e, não feliz com isso, ainda te deixo viúva dos seus filhinhos. Ô sina, ô vida de amargura! Somos duas desgramadas!
E dirige-se ao seu amado, no caixão:
– Ô, Neca. Não vai embora, pelo amor de Deus. Fica comigo. Levanta daí e vai pra roça, preguiçoso! Pára de me enganar e diz que quem morreu foram só os gatinhos. Isso não pode ser verdade.
E o marido lá, calado. Diante daquele silêncio todo, Daluca fica ainda mais nervosa e berra histérica:
– Me leva com você! Me leva, Neca! Quero ir com você!
Enterraram o Neca.
Sozinho.
E assim se passaram alguns dias. A Daluca quieta como nunca. O pouco que falava era alguma lamentação ou pedido de desculpas à gata, por ter sentado na caixinha com as crias.
– Ah, Dargisa! Pelo menos você tem os outros filhos. E eu?
Homem eu só tinha um.
Numa certa noite, no quarto escuro, lembrava-se dos momentos felizes com o amado, naquela mesma cama. Quanto amor, quantas loucuras... Nos últimos dias, as imagens dos dois, juntos, não lhe saiam da cabeça, e tinha uma estranha sensação de felicidade ao lembrar momentos tão doces. Quando estava quase pegando no sono, naquele momento em que não se está nem lúcida, nem adormecida, sente um carinho leve nos braços. Um suave roçar neles. Dos braços, passa para a barriga, até que, indecentemente, lhe acaricia o quadril. Por alguns segundos fica enlevada, deixando-se levar por aquele suave acariciar, enquanto balbucia:
– Ah, Neca, meu amor. Estou doente de saudades, meu corpo pede você...
Até lembrar-se do último pedido que fez ao falecido.
– Escuta aqui, pára já com isso. Sei que pedi; mas já mudei de idéia. Cria juízo! É cedo demais para eu ir. Sai daqui, Neca! Vade retro, que amanhã eu chamo um padre pra esse seu espírito bobagento!
Nessa agitação e esperneio percebe que, tão assustada quanto ela, a Dargisa sai debaixo das suas pernas, meio enroscada nas cobertas e corre para cima do fogão, nervosa e inquieta.
Sem rumo e sem graça, vai até a cozinha e toma uma água com açúcar. Olha para a gata e grita indignada:
– DARGISA, GATA BESTA, VÁ SE ESFREGAR NOUTRO FOGÃO DE LENHA!

texto: paulo moreira
imagem: josé eustáquio g. manso - olhares.com - portugal

domingo, 10 de janeiro de 2010

silêncio

Aprender amar por tudo o que não foi dito; pelo impossível de se explicar. A não ser pelo silêncio cúmplice.